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segunda-feira, janeiro 30, 2006



Fotografia


Esta noite preciso de outro verão sobre a boca crescendo nem que seja de rastos

Eugénio de Andrade, Limiar dos Pássaros




Fotografia do Efe

com olhos de vidro te observo

de longe, focando devagar

em tonalidades de negro te desejo de perto,

iluminando o teu olhar


em objectiva te sonho

com um toque suave dos dedos

sem perspectiva te saboreio

com um nomear quente de língua

enquadro o teu corpo, capturo a tua alma

desenho-te a cores quentes, em chamas,

paixão para fotografar em preto e branco, ardente, tesão.



sexta-feira, janeiro 27, 2006




Longe, perto.
Aqui, aí, na estrada,
no caminho que um dia faremos.

Tão dentro do meu coração
Tão fora do cubo branco dos meus dias
Tão longe de mim,
tão perto de ti…

Acendo o último cigarro do dia
devagar, tão devagar.

Podia ter acendido uma estrela
brilhante, nova, tão nova.

Fecho a persiana que me tapa a luz da noite
Hoje não há luar
Não voltarei a abrir a janela esta noite
Hoje já não há dia

Apago o último suspiro
devagar, tão devagar.

Podia ter-te amado na luz do luar
como quem acende uma estrela…

Mas fecho os olhos e apago a luz
longe de mim…
cada vez mais perto de ti.


quarta-feira, janeiro 25, 2006



Sonhos de névoa




fotografia de Maria Branco



Acordo com o sabor da noite nos lábios
vejo-me gata em telhado de zinco quente
ainda no reflexo da manhã em desalinho
desenho um rectângulo em branco no meu espelho
onde te desejo igual a mim

Com o dedo desenho no vidro
o contorno do meu corpo
com os lábios em surdina te nomeio
o reflexo brilhante devolve-me o desejo
surdo.. mudo.

Preciso de uma fotografia tua
Preciso das palavras feitas de sombras e linhas.

Faço então a viagem necessáriaaté à tua janela,
com o rio ao fundo
onde posas vaidosa.

Na tua janela
onde me despes lentamente
onde beijas de olhos abertos o desenho
dos meu contornos
onde beijas de olhos claros
o gemidodas minha cores.

Na tua janela
Recriamos o amor dos corpos reconhecidos
Reinventamos os sons do comboio aqui tão perto
Saboreamos os dias perdidos…

E enchemo-nos de azul….
Com o rio ao fundo.
Lá ao fundo….
da tua janela


sábado, janeiro 21, 2006



Random I


Roubei uma frase de um filme.

- Amo-te tanto que farei com que nunca chova quando passeares na rua, disse ele.

Não conto o final. Apenas espero pelo verão.


domingo, janeiro 15, 2006



E sobretudo


E sobretudo, é esta solidão que emerge, à mistura com o vapor do duche...

Fly Away


sábado, janeiro 14, 2006



Vês-me através do vidro...




fotografia de Nick Knight




O Tédio dos Sábados, ou de como acabar de vez com a Poesia


Acordou cedo. Hesitou entre adormecer de novo na sua enorme cama forrada a seda ou acordar para a vida. O sol que batia na janela fê-la decidir-se.
Optou por uma manhã no ginásio, aturdindo o corpo e adormecendo a alma, nada como o cansaço forçado para espantar os fantasmas dos sonhos de todas as noites, em que se via sempre a afogar num abismo azul de negro.
Achava sempre ridículo aquelas passadeiras que marcavam quilómetros inventando estradas falsas e as bicicletas alinhadas, que nunca a levavam a lado nenhum. Ridículo, correr tanto e nunca sair do mesmo lugar…Mas cumpria os rituais da moda.

Naquela manhã reparou na entrada de uma novidade. O rapaz da bomba de gasolina era a nova aquisição do espaço de culto dos corpos. Já reparara nele, quando pagava indiferente a gasolina e pedia um maço de tabaco.
Um corpo jovem e musculado, uma cor de chocolate morno, bebido em dias saborosos de chuva, era a memória de tinha deste rapaz que, por mero acaso, já lhe povoara algumas fantasias, que a acompanhavam na estrada, depois de atestar o depósito de gasolina.

No ginásio nada mais há a fazer do que caminhar e correr sem destino, olhar para os corpos que caminham alegres e esperançosos, ao nosso lado e deixar fluir a imaginação.

Ela optou por olhar para o corpo cor de chocolate morno que se lhe oferecia às suas fantasias dos sábados.
Ele olhou para ela e reconheceu-a. Na bomba de gasolina era, “bom dia Sr. Doutora”, ali era um corpo sem mestrados. Ele sorriu-lhe, sem saber como a cumprimentar, apenas com um sorriso. Ela retribuiu o sorriso e agradeceu aos deuses pela democraticidade destes espaços de músculos e suor e sorrisos, e por não haver diálogos no seu filme.

Treinaram juntos durante algum tempo. Ela, sabendo que nunca chegaria ao fim da estrada, ele pensando como chegar a um aparelho que ficasse mais próximo da passadeira onde ela corria pelos corredores do tédio.
Trocaram olhares pelo espelho. Sorrisos e olhares. Ela pensou – “Se falas sou capaz de te matar, ou então nunca mais vou à tua bomba de gasolina”. Ela sentiu que ele olhava o seu corpo pequeno e torneado, sentiu o prazer dele em vê-la no justo fato de ginástica, despida do fato de doutora que lhe comparava o maço de tabaco diário e que deixava na loja um cheiro doce de perfume.
Ela observou o esforço dele mostrar a sua performance naquelas máquinas infernais. Viu a sua t-shirt empapar-se em suor e sentiu o aroma daquela pele embrulhada em chocolate morno…
O ginásio agora esvaziava-se. A hora de almoço aproximava-se.
Ela parou o treino. “Chega”, pensou, “Hoje gostava de chegar ao fim desta estrada feita de plástico”.
Passou por ele e sorriu. Tocou-lhe são de leve no braço suado e disse baixinho
- Espero-te na sauna.
Sabia que a sauna não era mista, ele teria de passar pelo balneário feminino, mas achou que valia o risco. Pensou – “Se não vieres, não passas de uma miragem no meio do deserto, mas também não deves saber o que é uma metáfora e não serei eu a ensinar-te”.

Despiu-se no balneário, deixou a água do duche abraçá-la em jactos mornos e depois entrou na sauna.
A porta abriu-se e ele entrou. Nu, tão nu como o horizonte ao fim do dia. Chegou até ela e abraçou-a. Ela deixou-se abraçar. Tentou beijá-la, mas ela tapou-lhe a boca com a mão. Não queria palavras, nem beijos. Como as putas. Com a outra mão tapou-lhe os olhos. Não queria ser vista. Como as sereias.

Ele pegou-lhe ao colo e ela entrelaçou as pernas no seu tronco. Sentiu o sexo dele, duro, erecto de encontro ao seu ventre. Sabia que não precisava de o conduzir. Ele encontraria o caminho. Ele penetrou-a com doçura e ela deixou-se afogar. Ele conduzia, acelerava o ritmo, percorria o prazer dela, aumentava a potência e ela mergulhava numa onda de vapor e de silêncio. O orgasmo dele foi intenso, abafado pela mão dela que ainda se mantinha na sua boca. Pô-la devagarinho no chão e tentou abraçá-la mais uma vez.

Ela disse num sussurro – “Agora sai.”

Ele saiu sem dizer uma palavra, atordoado pela surpresa. Ela deitou-se calmamente num dos bancos da sauna e masturbou-se com delicadeza.
Este orgasmo seria só seu, não lho oferecera.

Afinal, a estrada era dela. O abismo, também.


terça-feira, janeiro 10, 2006



Em Chamas


(Arquivo)


Sou o teu poema por escrever
Faço do meu corpo o teu papel em branco

Passeio os sonhos como conchas
Navego no teu barco como corpo
Beijo-te os olhos como palavras
Abro as coxas como ondas
Recebo-te como mar
Amo-te como espuma
Sonho-te como nuvem
Seduzo como sereia
Dou-me como fêmea

Sou o teu poema por escrever
O verso que te falta será escrito
Com o teu dedo nos meus lábios
Em silêncio gritado na vaga final.


quarta-feira, janeiro 04, 2006



Fotografias


Nunca usámos a máquina. Nunca precisámos de câmaras.

Sempre nos bastou a cabeça, a pele, a ternura, a imaginação, o tesão, a cumplicidade.
Só usámos os olhares, as mãos, os aromas, as bocas, os sorrisos, as fantasias, o teu sexo e o meu, as gargalhadas, as palavras, as carícias, a presença, a ausência…

Usamos sempre as nossas fotos nas molduras da memória.

Tu, enquadrado, sentado, num sofá de cor difusa, sério, focando no teu olhar o meu reflexo no espelho, fumando o cigarro que apenas eu te permitia, o único cigarro do dia…

Eu, de pé, encostada a uma mesa sem design, vestida para ser despida, saia escandalosa de folhas de plátanos cinza aberta em cascata sobre o meu sexo, cuecas infames cor-de-rosa, que cobrem o teu desejo, acariciado assim… por mim…

Temos as fotografias. Dos orgasmos que tivemos não conta a estória. Esses são efémeros.
Temos as fotografias. Dos sorrisos cansados e felizes de prazer.


terça-feira, janeiro 03, 2006



O teu Piano



Toca-me como se a minha pele fossem as teclas do piano.
Toca-me numa melodia única.
Toca o meu sexo com os tons de maresia e os meus seios com os tons de jazz.
Toca as minhas coxas entreabertas em portas de sedução
Toca os meus lábios em acordes de paixão.


segunda-feira, janeiro 02, 2006



Ser todas as Mulheres…


"Ser a moça mais linda do povoado", disse ELA do abismo da sua angústia de mulher e poeta fora de tempo




"Em Hollywood pagam-te 1.000 dólares por um beijo, mas só 50 cêntimos pela tua alma", disse Ela da piscina dos seus olhos de mulher e pessoa fora de tempo.




Ser um corpo sem alma.
Ser o outro lado do espelho
Ser pele, coxas, lábios, tesão, poesia.
Ser o teu sonho…

E depois só o som do saxofone esta noite, em tons de jazz perfeitos…
E depois só os acordes de mim…

...disse eu...



domingo, janeiro 01, 2006



Espera...


Estar só nem sempre é solidão.
As carícias em segredo sonhadas
nem sempre são ilusão.

Há por vezes uma luz colorida
Que nos diz…

Posso sempre esperar por ti.